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HINTS e o diagnóstico na síndrome vestibular aguda

Diagnosticar acidente vascular cerebral (AVC) na síndrome vestibular aguda é de suma importância. Aliás, um episódio agudo de vertigem é sempre algo que gera grande desconforto, receio e angústia não somente para o paciente, mas também para o médico que avalia esse quadro, principalmente se for o primeiro episódio e o ambiente for o setor de emergência. É sobre essa questão e seus desdobramentos que fala William Luciano de Carvalho, coordenador do DC de Distúrbios Vestibulares e do Equilíbrio da ABN, ao analisar o estudo HINTS to diagnose stroke in the acute vestibular syndrome – three-step bedside oculomotor exam more sensitive thon early MRI diffusion-weighted imaging*

Vamos à entrevista.

O que significa o acrônimo HINTS?

O acrônimo HINTS (Head-Impulse – Nystagmus – Test-of-Skew) tem sido utilizado para auxiliar o neurologista ou qualquer médico, principalmente no setor de emergência, a avaliar um paciente com quadro de vertigem de instalação aguda. Assim, a avaliação do reflexo vestíbulo-ocular (head impulse test), do nistagmo e do desvio skew do olhar tem recebido destaque na literatura.

Quais os diagnósticos diferenciais de uma síndrome vestibular aguda?

Pacientes com vertigem ou tontura respondem por cerca de 4% dos casos em um setor de emergência. Considerando apenas os quadros neurológicos na emergência, a vertigem corresponde a 12% desses casos. E, surpreendentemente, 25% deixam a emergência sem um diagnóstico definido. As síndromes vestibulares agudas são, em sua maioria. De origem periférica, porém cerca de 11% dos pacientes que se apresentam.com uma vertigem isolada, simulando assim uma vertigem periférica, tem AVC. Notadamente isquemia cerebelar, recebendo equivocadamente diagnóstico de vertigem periférica. Um episódio agudo de vertigem e sempre algo que gera grande desconforto, receio e angústia não somente para o paciente, mas também para o médico que avalia o quadro, principalmente se esse for o primeiro episódio e o ambiente for o setor de emergência. Nesse contexto, a grande preocupação de ambas as partes é saber se se trata ou não de alguma coisa grave, como algo central. Assim, a grande pergunta a ser respondida inicialmente é: “Trata-se de uma síndrome vestibular central ou periférica?”. É esse o principal diagnóstico diferencial de uma vertigem de início agudo: a vertigem de origem central, principalmente por acidente vascular encefálico. E é nesse contexto que a avaliação neurológica global, incluindo. O HINTS. Trará ao clínico as informações necessárias para que se responda a essa pergunta inicial. Para além da vertigem de origem central de etiologia vascular, deve-se estar atento também para outras etiologias de vertigem central de início agudo, como primeiro surto de uma doença desmielinizante, infarto Labiríntico, enxaqueca vestibular e até mesmo cinetose. Dentre as etiologias mais frequentes de vertigem aguda periférica estão: vertigem posicional paroxística benigna (VPPB), neurite vestibular, doença de Meniere e enxaqueca vestibular. 

Como esse método HINTS pode ajudar o médico (neurologista ou não) a identificar AVC nos casos de síndrome vestibular aguda no pronto-socorro?

Não dispensando uma boa anamnese, que primeiramente auxiliará o clínico a diferenciar causas de tontura relacionadas a condições clínicas não neurológicas e causas cardiológicas (por exemplo, hipotensão ortostática. Desidratação, síndromes de baixo débito, efeitos colaterais de medicações. pré-síncopes ou síncopes, e arritmias) dos quadros vestibulares periféricos e centrais o HINTS é ferramenta de grande auxílio por ser breve e por trazer informações de grande relevância na detecção de síndromes vestibulares centrais. A detecção de apenas um desses três sinais avaliados pelo HINTS, reflexo vestíbulo-ocular (VOR) pelo head impulse test, nistagmo e desvio skew do olhar, é suficiente para proceder à investigação de vertigem de origem central, o que muitas vezes resulta em indicar a internação desse paciente para monitoramento e melhor avaliação, incluindo exame de neuroimagem (ressonância nuclear magnética – RNM). A avaliação e a interpretação desses três sinais devem ser feitas da forma que se segue:

– Head-impulse test (avaliação do VOR): A presença de VOR NORMAL é indicativa de LESÃO CENTRAL. É um sinal, portanto, contra intuitivo, no sentido de que quando se apresenta normal é que se deve pensar na situação de maior risco, ou seja, de causa central. Assim, VOR normal é indicativo de lesão vestibular central e VOR alterado deve ser interpretado como sinal de lesão periférica. Isso fica fácil de ser entendido quando lembramos que se trata de um arco reflexo e, portanto, sua resposta alterada decorre de lesão do nervo vestibular (na maioria das vezes). Fica aqui a lembrança de que o núcleo vestibular, na transição ponto-bulbar, também participa desse reflexo, e de que sua lesão, embora menos frequentemente, pode da mesma forma levar a uma resposta anormal do VOR. Devendo ser cuidadosamente observadas a pesquisa de outros sinais de tronco encefálico e a avaliação de fatores de risco para doenças cerebrovasculares. – Nystagmus (características do nistagmo): A observação de nistagmo evocado pelo olhar (aquele que muda de direção conforme a direção do olhar), nistagmo que não reduz sua intensidade à fixação visual (ao solicitar ao paciente que fixe o olhar em um ponto, como a ponta do dedo ou do nariz do examinador), nistagmo vertical para cima (upbeat) ou para baixo (downbeat), e nistagmo puramente torcional (como se os olhos girassem no eixo antero-posterior) é indicativa de vertigem de origem central, – Test-of-Skew (desvio skew do olhar): A presença desse sinal neurológico é indicativa de lesão central. Trata-se de um desalinhamento vertical dos olhos (um dos olhos está em uma posição inferior, abaixo – hipotrópico -, enquanto o outro está mais alto, acima – hipertrópico) decorrente de um desbalanço das vias vestibulares e motoras oculares centrais que participam do reflexo otolítico-ocular (OOR). Pode ser identificado já na posição primária do olhar (pedindo-se ao paciente que fixe o olhar em um ponto central do campo visual), mas deve também ser pesquisado solicitando-se ao paciente que fixe o olhar enquanto se taz a oclusão alternada de um olho para outro (fixação do olhar com o cover test, alternando a oclusão ocular de um olho para o outro). Enquanto o que se observa em pacientes normais é uma refixação do olhar sem nenhum movimento ocular (ao se descobrir o olho, este mantém-se imóvel), nos pacientes com desvio skew observa-se uma sacada vertical na refixação do olhar (ao se descobrir o olho, este movimenta-se rapidamente no plano vertical, realizando assim uma sacada vertical para atingir o alvo de fixação do campo visual, resultando em um desalinhamento vertical do olhar.

A partir do estudo aqui avaliado, quais seriam a sensibilidade e a especificidade para o diagnóstico de síndrome vestibular por AVC?

Esse estudo demonstrou, assim como vários outros que o seguiram, que a realização do HINTS tem sensibilidade de 100% e especificidade de 96% na detecção de síndrome vestibular aguda de causa central por AVC. A sensibilidade foi superior à observada pela realizacão de RNM de encéfalo nas primeiras 48 horas de instalação do quadro clínico (RNM de encéfalo apresentou sensibilidade de 72% e especificidade de 100%). E aqui é importante destacar que, quando se quer avaliar por neuroimagem um quadro de vertigem aguda, o exame de eleição é a RNM de encéfalo, uma vez que as lesões estão confinadas à fossa posterior (tronco encefálico e cerebelo) e a tomografia de crânio é um método bastante limitado para avaliar essa topografia (30% dos AVCs de cerebelo são dispensados da unidade de emergência em uma primeira avaliação, e, destes, 75% tem tomografia de crânio normal). No estudo em questão 94% dos pacientes foram avaliados por neurologista.

No estudo em questão, 94% dos pacientes foram avaliados por neurologista.

 Em sua opinião, quais são as dificuldades ou limitações do uso do HINTS pelo clínico e, mesmo, pelo neurologista?

Podemos resumir essas dificuldades em uma única palavra: conhecimento. Primeiro em relação à ferramenta em si, o HINTS, de rápida aplicação (cerca de um minuto), baixo custo (exame clínico) e, como já dito, de excelente acurácia (sensibilidade e especificidade). Apesar de todas essas qualidades, poucos neurologistas sequer ouviram falar sobre esse acrônimo, ou seja, não é ainda de amplo conhecimento e domínio dos neurologistas e clínicos, de modo que sua divulgação é importantíssima. Em segundo lugar, questões técnicas, principalmente na interpretação do head impulse test (avaliação do VOR), teste que traria maior dificuldade de interpretação dentre os três que compõem o HINTS e que, portanto, demanda treinamento do profissional. Mas mesmo a interpretação do nistagmo ainda é tarefa difícil para grande parcela dos neurologistas, sem falar no desvio skew do olhar, sinal neurológico também pouco conhecido mesmo no meio neurológico. Desse modo, a divulgação do HINTS é a primeira etapa do processo de implementação e uso rotineiro dessa ferramenta nas unidades de emergência, o que irá propiciar ao neurologista uma estratégia rápida, segura, barata, não invasiva, eficaz e confiável de avaliação de pacientes com síndrome vestibular aguda.

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