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O sonho de um homem ridículo – Fiodor Dostoievski (1877)

Por Raphael Ribeiro Spera, membro do Conselho Editorial do ABNews, médico neurologista pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Uma das últimas obras de Dostoievski, O sonho de um homem ridículo compreende um conto que foi um marco ímpar na literatura mundial, sendo considerado uma “pequena obra-prima”. Retratando sua fase literária tardia, após ter sua pena de morte comutada em 4 anos de trabalho forçado na Sibéria, em 1849, as obras desse período são mais ricas e reflexivas. Exímio criador de personagens, o autor russo beira a perfeição na criação de um indivíduo sem nome, teoricamente niilista, possivelmente depressivo e que se entrega à dúvida entre continuar ou não a viver nos últimos dois meses, até um encontro casual com uma menina de oito anos em uma noite lúgubre e chuvosa na cidade de São Petersburgo.

Após chegar em casa e cair inesperadamente no sono, na dúvida entre atirar ou não contra si, o personagem adentra o estado onírico quando encontra o paraíso, sendo transportado por uma figura angelical, onde aparentemente tudo funciona na mais perfeita ordem – uma espécie de olimpo não corrompido pela serpente retratada no Genêsis. Nessa cena, por período por tempo indeterminado, são desenvolvidos diversos dilemas éticos, morais e filosóficos que nortearam e ainda conduzem questões de nossa existência como espécie humana. Sentido da vida, significado das ações e vontades, bem versus mal: “Eu não quero e não posso acreditar que o mal seja o estado normal dos seres humanos”.

Sabemos que o sono possui diversos estágios que se repetem ao longo de uma noite. Durante o sono REM (rapid eye moving), nosso cérebro encontra-se ativo, fragmentos da memória se fundem e criam histórias, muitas das quais estavam silentes em nosso inconsciente. 23 anos após a obra do escritor russo, era publicada A Interpretação dos Sonhos, de Sigmund Freud, um marco da psicanálise, possivelmente com alguma influência desse e de outros livros. O tema do sono é hoje tratado de forma importante na neurociência, seja o aspecto fisiológico, seja a representação clínica de diversas enfermidades neurológicas.

O sonho do personagem é tão rico em detalhes e significado, que ele não acredita ter sido apenas sonho. Será que vivenciou aquilo de fato? Como disse: “Quem governa os sonhos, aparentemente, não é a razão, e sim o desejo, não é a cabeça, e sim o coração, e, no entanto, que coisas engenhosíssimas minha razão não realizava durante um sonho!”.

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