A vertigem transitória isolada pode se apresentar como um episódio sem sinais focais e livre de sintomas. Pesquisas anteriores já demonstraram uma série de casos com alto risco de acidente vascular cerebral durante o seguimento. O estudo Isolated transient vertigo due to TIA: challenge for diagnosis and therapy (https://urlfr.ee/vmg6j) revisa o conhecimento atual sobre a epidemiologia, fatores de risco, lesões agressoras e manifestação clínica do ataque isquêmico transitório (AIT) quando apresentada como vertigem transitória isolada. Nessa reportagem, Saulo Nardy Nader, coordenador do DC de Distúrbios Vestibulares e do Equilíbrio, faz uma raio-X do paper para você, leitor do ABNews.
Comente a importância da vertigem no aspecto de prevalência e epidemiologia em atendimentos ambulatoriais e pronto-socorro.
Como aproximadamente 15-35% dos adultos serão vítimas de uma crise de vertigem ao longo de sua vida, e estimando-se que 5% dos atendimentos ambulatoriais e 4% dos maiores de 16 anos buscam um atendimento de emergência por tontura e vertigem, é bastante importante o rápido e fácil reconhecimento pelo médico de quadros centrais que acarretam riscos maiores à saúde (por exemplo, um AVC ou o AIT de tronco ou cerebelo). Para se ter uma idéia da dificuldade, em cerca de ¼ dos pacientes cuja principal queixa é vertigem na sala de emergência, é diagnosticado apenas o sintoma (tontura e vertigem), sem a correta identificação da etiologia por trás do sintoma. Por curiosidade, aproximadamente 21% dos AITs vertebrobasilares se manifestam com vertigem isolada, sem outros sintomas. E estima-se que 4% dos casos de vertigem na emergência seja decorrente de um AVC.
Quando pensar que uma vertigem transitória isolada pode estar relacionada a um evento neurovascular agudo, como um AIT ou AVCi minor?
Quando há a presença de 3 ou mais fatores de riscos cardiovasculares, entre eles HAS, DM, DLP, tabagismo, FA, Iam prévio. A presença de hipoplasia vertebral previamente conhecida também vem sendo apontada como um potencial fator de risco para o AIT de tronco. Além, disso, achados de exame neurológico centrais também apontam para essa possibilidade.
Quais as principais artérias e territórios envolvidos na vertigem isolada transitória central?
Estatisticamente, a PICA é a artéria mais envolvida em vertigem isolada aguda de origem neurovascular.
Lesões em núcleos vestibulares, em flóculo, nódulo ou tonsila cerebelares, no pedúnculo cerebelar inferior e no núcleo prepósito do hioglosso podem ser responsáveis por um quadro de vertigem isolado em um contexto de AIT.
Embora zumbido e perda auditiva sejam frequentemente associados a lesões exclusivamente periféricas, lesões da artéria auditiva interna (ramo terminal da AICA) também podem gerar vertigem com zumbido e perda auditiva (por isquemia labiríntica associada), sendo então zumbido e perda auditiva em uma crise de vertigem isolada um sinal de alerta para possível causa central (e não um sinal de despreocupação).
E vale citar ainda as lesões de basilar como as vilãs, muitas vezes, de agressão vestibular central, causando vertigem
isolada.
Fica a ressalva: vertigem resultante de AIT em território anterior é considerado algo raro, e quando ocorre, usualmente leve e transitório (pode ocorrer principalmente por lesão de ínsula e cortex parietal opercular). Porém, mais estudos a respeito da real incidência de vertigem em processos vasculares corticais precisam ser realizados.
Destaque as principais características clínicas e achados de exame neurológico à beira leito que podem auxiliar o diagnóstico de uma etiologia neurovascular para vertigem isoladamente.
A vertigem resultante de um AIT vertebrobasilar pode ter duração curta de segundos ou durar de minutos até muitas horas. Um estudo recente apontou que na metade das vezes a vertigem dura pelo menos 1 hora. Convém lembrar que em 70% dos casos, o paciente chega sem sintomas e achados ao atendimento médico de urgência. Logo, além do HINTs, outros dados têm que ser considerados para um diagnóstico presuntivo.
Quando existe a presença de sintoma ativa no atendimento médico, a aplicação da escala HINTs plus é bastante útil, uma vez que a presença de pelo menos um achado já é indicativo de quadro central (VOR sem alteração; Nistagmo evocado pelo olhar lateral que muda de direção ou nistagmo vertical; presença de Desvio Skew; perda auditiva nova). Além do HINTs, presença de ataxia axial, alteração de seguimento e sacadas também devem ser valorizados como reforçadores da possibilidade de quadro central. Vale lembrar ainda que dor cervical nova acompanhada da vertigem isolada pode ser uma dica pra quadros de dissecção de artéria vertebral.
O que dizer sobre o papel da neuroimagem e o futuro da investigação das causas de vertigem?
Como já é sabido, a tomografia computadorizada possui uma baixíssima eficiência em detectar lesões de tronco e cerebelares na fase aguda, pelas limitações do método.
Por mais estranho que pareça, a ressonância magnética não consegue identificar nas primeiras 24 horas 50% dos infartos cerebelares e de tronco menores que 1 cm e 20% dos infartos maiores nessas regiões. Realizar a ressonância com cortes finos (3 mm), acrescentar cortes sagitais e sequência 3D-FLAIR aumenta a probabilidade de acerto nesse contexto. Curiosamente, um autor averiguou que a sensibilidade e a especificidade do HINTs dentro de 48 horas do quadro agudo em evolução eram maiores que de uma ressonância magnética. Estudos de vasos (angioRM ou angioTC) mostrando hipoplasia ou estenose da artéria vertebral são um fator de reforço para quadros isquêmicos, gerando vertigem. PET CT e ressonância funcional podem ter um papel também na identificação de hipoperfusão, levando a vertigem, mas mais estudos são necessários.