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Arquivos de Neuro-Psiquiatria, custo do AVC em um hospital público no Brasil

Juliana Safanelli é uma expert quando o tema é investimento X benefícios dos tratamentos do Acidente Vacular Cerebral. Enfermeira pesquisadora no Registro de AVC de Joinville e mestre em Saúde e Meio ambiente pela UNIVILLE, também responde pelo Projeto de Custo do AVC no JOINVASC.

Ela é uma das autoras do trabalho O custo do AVC em um hospital público no Brasil: um estudo prospectivo de um ano, publicado na revista Arquivos de Neuro-Psiquiatria.  Os resultados foram apresentados após a colheita de todos os custos médicos e não médicos de pacientes internados com diagnóstico de acidente vascular cerebral durante um ano, mensurando os custos por tipo de AVC e tratamento, tempo de permanência e comparamos os custos hospitalares com reembolso governamental. É sobre a temática que Juliana se manifesta ne entrevista a seguir. 

A que se deve a queda vertiginosa na incidência de AVCs, em Joinville, nas últimas duas décadas?

Acreditamos que tenha relação com uma melhora na Atenção Primária da Saúde,  aumento no número de equipes de Estratégia da Saúde (ESF) em Joinville, acesso aos medicamentos para HAS através do Programa Farmácia Popular do Brasil, assim como Programas de prevenção para as doenças crônicas nas UBS 

Qual foi porcentagem de AVC isquêmico e AVC hemorrágico nesses estudos. Houve diferença na incidência dos dois tipos de AVC entre o setor público e o privado?

Ao incluirmos estes dois tipos de AVC não observamos diferença estatisticamente significativa entre as instituições. No entanto, os valores brutos demonstraram uma maior proporção de AVCs hemorrágicos no setor público (16%, enquanto no privado foi 9%).Os AITs corresponderam a 12 % das internações no setor público e 15% no privado, e os AVCs a 72% no público e 76% no privado.

Em quanto ficou custo médio por paciente com AVC? Quais variáveis impactaram mais as despesas desses pacientes?

No hospital público o custo médio por paciente com qualquer tipo de AVC foi de R$ 9.670,00, quando estratificamos por tipo de tratamento os valores foram: sem terapia de reperfusão R$ 5.680,00 ; trombólise R$ 10.340,00 e trombectomia R$ 22.300,00

Na amostra do AVC h o custo médio por paciente foi R$ 5.430,00. 

As principais variáveis que impactaram na despesa hospitalar foram: gravidade (NIHSS), tipo de tratamento e etiologia do AVC. Observamos que fatores como idade, comorbidades e as complicações também contribuem para o aumento do custo do tratamento do AVC na fase aguda.

Que tipo de AVC se mostrou o mais dispendioso e porque?

A HSA mostrou -se mais dispendiosa em ambos os estudos e tem relação com sua gravidade, tratamento e complicações. Entretanto devemos considerar que o tratamento para cada tipo de AVC, a estrutura e os protocolos de cada instituição são diferentes.  No serviço privado o paciente com AVC tem muito mais acesso a uma UTI por exemplo, que tem o custo mais elevado. 

Já no serviço público, um grande número de pacientes tem acesso a Unidade de AVC, que demonstraram ter um custo menor do que os outros setores e traz melhores resultados. 

Uma das conclusões dos estudos foi que o tempo de internação está diretamente relacionado com custos mais elevados. Como explicar que procedimentos tais como a revascularização endovenosa e intra-arterial e a trombectectomia mecânica, as quais, teoricamente, diminuiriam o tempo de hospitalização, se mostraram muito mais onerosas do que os procedimentos convencionais?

A realização de trombectomia mecânica esteve associada a um tempo menor de hospitalização e menores custos com complicações da imobilização e internações prolongadas. No entanto, as economias não são grandes o suficiente para suplantar os custos iniciais do tratamento quando utilizamos um horizonte temporal tão pequeno quanto uma internação hospitalar.

Ainda assim, mesmo quando consideramos apenas os custos hospitalares, sem incluir economias possíveis, o tratamento é altamente custo-efetivo, devendo ser considerado como uma das estratégias mais importantes para reduzir o impacto da doença na sociedade.

Na opinião dos autores, o alto custo para realização desses procedimentos durante a internação seria compensado por menores gastos em serviços de reabilitação, maior porcentagem de retorno à vida produtiva e menores índices de institucionalização dos pacientes submetidos a eles?

Existe a possibilidade dessa expectativa se concretizar, uma vez que diversos estudos publicados em países desenvolvidos suportam essa hipótese. No entanto, o que temos observado é que a realidade do acompanhamento pós-AVC no SUS é bastante diferente da reportada em países desenvolvidos. Em países como Suécia e Inglaterra, o Estado assume de forma mais completa os custos pós-AVC, disponibilizando serviços de reabilitação e cuidadores (“nursing homes”). No Brasil, temos uma situação em que os custos com cuidados pós-AVC recaem na maior parte no paciente e sua família. Não sabemos se nosso modelo é mais barato, o que podemos dizer é quem paga o maior preço.

Tendo em vista esta disparidade, temos estudado não apenas os custos diretos médico-hospitalares, que são pagos pelo SUS, mas também o custo do AVC para a sociedade. Temos que lembrar que o AVC ocorre em 1 a cada 4 pessoas. É do interesse de cada um que o país esteja preparado para prevenir novos casos de AVC e, quando não for possível prevenir, que o tratamento seja feito de forma a gerar um menor encargo à sociedade.

Com base nesses resultados, que medidas poderiam ser tomadas com o objetivo de reduzir os custo do tratamento do AVC, principalmente nos serviços de saúde pública?

Nosso estudo reforça a ideia de que o AVC deve ser tratado em rede, de forma protocolar. Essa é a única forma de garantir o acesso a tratamentos como trombólise e trombectomia, enquanto evita gastos desnecessários e custos com complicações do manejo incorreto de pacientes. Os protocolos devem englobar toda a Linha de Cuidado do AVC, que vai da prevenção primária à reabilitação e prevenção secundária. A falha em uma das etapas determinará menos eficiência no tratamento do AVC e, potencialmente, maiores custos.

Além disso, demonstramos que as unidades de AVC possuem em nosso meio um custo menor do que o tratamento em outros setores. Sugerimos fortemente que essa informação seja levada em consideração por gestores ao planejar os investimentos em saúde nos próximos anos.

Veja o estudo em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0004-282X2019000600404&script=sci_arttext

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