Doença neuromuscular autoimune, a miastenia gravis (MG) é alvo de estudo observacional retrospectivo com 15 pacientes portadores admitidos com COVID-19 em quatro hospitais de São Paulo, Brasil. O autor principal do trabalho (https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/33013676/) é o especialista em Doenças Neuromusculares pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade
Ao ABNews, Edvan fala com exclusividade sobre o paper que teve a coordenação do professor dr. Edmar Zanoteli, uma referência de nossa Neurologia. Confira.
Como foi possível fazer um estudo de infecção pelo COVID-19 e Miastenia Gravis (MG), uma doença neurológica rara? Quantos pacientes compõem o estudo?
A miastenia gravis é uma doença autoimune que compromete a transmissão dos impulsos neuronais até o músculo, levando à graus variáveis de fraqueza em músculos da face, deglutição, além de braços e pernas. Apesar de doença rara, com uma prevalência aproximada de 20 em cada 100.000 habitantes, pudemos realizar um estudo incluindo 15 pacientes com a cooperação de 4 grandes centros de doenças neuromusculares na cidade de São Paulo liderados pelo grupo de Doenças Neuromusculares do HCFMUSP entre março e maio de 2020. Nossa série de casos é a maior já publicada no mundo discorrendo sobre os desfechos de pacientes com miastenia e COVID-19.
Qual foi a gravidade do quadro clínico da maioria dos pacientes com MG do estudo? E as principais manifestações clínicas?
O presente estudo incluiu apenas pacientes com quadro de COVID-19 confirmado por PCR e que necessitaram de internação hospitalar. Dos 15 pacientes, 13 (86.7%) necessitaram de internação em UTI.
Onze pacientes (73,3%) necessitaram de intubação orotraqueal e os quatro restantes (26,7%) utilizaram apenas cânula nasal de oxigênio. Falta de ar (93,3%), febre (86,7%), tosse (66,7%) e mialgia (46,7%) foram os sintomas de apresentação mais comuns.
Se o paciente com MG e em fase aguda da infecção pelo COVID-19 evoluir com descompensação da doença neuromuscular, é seguro fazer imunoterapia com imunoglobulina e plasmaférese?
Nosso estudo sugere que o uso de terapias imunossupressoras direcionadas ao tratamento da descompensação da miastenia durante infecção por COVID-19 é seguro. Quatro pacientes foram submetidos à plasmaférese e um paciente recebeu imunoglobulina, não havendo complicações e todos com desfechos favoráveis.
Podemos concluir a partir desse estudo que a MG é fator de risco para infecção grave por COVID-19? A mortalidade foi maior neste grupo?
A mortalidade em nosso estudo dos pacientes portadores de miastenia que necessitaram de internação hospitalar devido COVID-19 foi de 30%. Estudos com outros pacientes com COVID-19 em populações gerais que são admitidos em hospitais tem mortalidades variando entre 21 a 28%. Porém, não podemos concluir que miastenia gravis é fator de risco para um quadro grave de COVID-19. Nosso estudo incluiu apenas pacientes hospitalizados e seu possível curso desfavorável pode estar associado a outras variáveis, como idade, comorbidades ou comprometimento pulmonar. Os pacientes falecidos de nossa coorte tinham fatores de risco semelhantes aos dos pacientes falecidos que não tem miastenia pelo COVID-19 (eram homens, tinham mais de 60 anos e/ou comorbidades). Portanto, não podemos fazer concluir que MG é um fator de risco independente para morte em pacientes com COVID-19.